12 de setembro de 2012

Leigos de alma.

Ela sempre tão correta com tudo e todos, tinha guardado em si todas as inseguranças do universo. De forma prestativa, enganava o mundo com um sorriso um tanto quanto torto e vez ou outra elogiavam aquele sorriso. Leigos de alma. Portava-se como rainha e se virava com gestos de adolescente em ingenuidade de criança, porém conhecia sobre muita coisa e sabia exatamente o protocólo de variadas situações, sabia inclusive da maldade no coração dos alheios e sabia mais ainda sobre o quão verdadeiro eles fazem parecer falsos sentimentos. Não se deixava enganar por ilusões passageiras, tão menos por frases repetidas ditas por bocas convincentes de rostos bonitos, - não mais. Com um intelecto aguçado e bem treinado para identificar erros de repertório, esqueceu-se de aprender a identificar a si mesma. Se olhava no espelho para não dizer que não possuía nenhuma vaidade e passava um batom para não sangrar os lábios; Pintava as unhas porque gostava, mas se elas estivessem nuas também não era problema. Ela achava que seu andar era estranho, e tentava mudar, mas estranhava mais e voltava a como era no princípio. Inventava um novo ‘modelito’, se orgulhava, mas logo temia sair de casa com ele e voltava ao bom e velho jeans. Era meio que uma sensação extremista, a garota excluída de filmes de colegial americano. Sempre se sentia insatisfeita com peso, altura, bronzeado, e milhares de outros detalhes aos quais recusava admitir, mas qualquer um que a olhasse iria notar generosidade envolta em uma completa tentativa de ser melhor a cada dia. Ela se tornara isso, esforço. De críticas e noites em pranto, se fez perceber que era necessário mudar sua postura de jovem do drama, seu jeito rude de demonstrar afeto e sua maldosa mania de sentir antipatia a tudo que é novidade. Aprendeu por mal que a vida cria ciladas onde menos se espera e que orgulho demais atrapalha. Aprendeu que por mais que pareça amor, as vezes é só coisa momentânea, e que por mais que pareça pra sempre, as vezes é só um curta-metragem. A realidade é que ela se machucava com essa história de vai e vem, se doía com essas turbulências, com sua mania de desconfiar de todos ao seu redor, de levar elogios na brincadeira, de achar absurdo que alguém se apaixonasse por ela, afinal, nem ela mesma se aguentava em diversas situações. Por outro lado, tinha um coração meloso, uma necessidade de fazer piada em meio a conversas tensas, de sorrir para gente estranha na rua. Odiava ver tristeza nos outros e se fazia mil para poder tornar a solidão de alguém menor. Com um humor oito ou oitenta, guardava uns cinco ou seis para quem sempre estava disposta. Odiava futilidade também, odiava frescura demais, manha demais, charme demais, cor de rosa demais; odiava tudo que lhe parecia artificial, montado, forçado. Preferia a casualidade ao compromisso e a pequenez ao estrelato. Era simples e complexa, completa e vazia, tudo e nada num mar de sequidão.
Como a bailarina exausta em fim de espetáculo, ela era a música que todos querem ouvir por mais de uma vez.''